Destino final, casa: Barrios volta às origens com o Grêmio para brilhar na Argentina

Um, dois, três... Gabriel conta os pesos enquanto dirige o carro pelas ruas de San Fernando na década de 90. No banco do lado está seu pequenino irmão Lucas, com fome. Seis anos mais velho, o motorista estaciona o veículo para comprar um sanduíche. Ambos dividem a refeição em uma parceria que transcende a irmandade. Se faltaram moedas para o refrigerante no passado, hoje, esses pesos sobram. Mas não duvide se Lucas Barrios levar na memória esta história ao pisar no Estádio La Fortaleza, na noite desta quarta-feira, para a final da Libertadores, contra o Lanús. Para o centroavante do Grêmio, o sanduíche de agora é a conquista da América.



O atacante gremista nasceu e cresceu na Argentina, local da decisão e onde pode conseguir a "taça que falta", conforme define seu pai, Eugenio. Quis o destino que seu Tri da América fosse em casa, a poucos metros de onde passou a infância, foi descoberto para o futebol e de onde não brilhou. Ao vivo no estádio estará o irmão Gabriel, que o acompanha e viaja constantemente a Porto Alegre.

- É a única taça que está faltando. Sempre foi campeão. É confiar em Deus e entrar na campo pedindo que seja iluminado. Vão a ganhar, sim ou sim! - diz seu Eugenio ao GloboEsporte.com.

- Estou muito contente. Quando ele vem jogar aqui, perto de nós... Espero que, se Deus quer, saia tudo bem - emocionou-se Petrona, mãe do atacante.

Petrona, Eugenio e Gabriel, familiartes de Lucas Barrios (Foto: Eduardo Moura/GloboEsporte.com)

Em uma final de Libertadores, Barrios também cumpre o objetivo com o qual chegou ao Grêmio: ser vencedor no Brasil. Independentemente do título, deixará os dias de Palmeiras no passado com seus 18 gols com a camisa gremista - é o vice-artilheiro do Grêmio na Libertadores com seis, um atrás de Luan.

- Barrios gosta muito de Porto Alegre. E no Grêmio ele é querido. Renato gosta muito dele, ele gosta muito do Renato. A torcida também gosta muito - conta Gabriel, impressionado com os três mils gremistas a apoiar o time no embarque para Buenos Aires, na segunda.

Primeiros passos em San Fernando

Gabriel mostra local onde Lucas Barrios foi descoberto por olheiro na Argentina (Foto: Eduardo Moura)

Lucas Barrios nasceu em 1984 na localidade de San Fernando. A família só saiu dali em meados dos anos 2000. E apenas fisicamente. As raízes, a formação, toda foi no entorno. A convite do GloboEsporte.com e da RBS TV, o irmão Gabriel guiou a reportagem onde o atacante foi descoberto. Quando muitas pessoas percebiam a presença do Barrios mais velho, seja no carro ou em frente a casa, os moradores abriam largos sorrisos e gritavam saudações.

A casa onde hoje estão os pais de Barrios, Petrona Cáceres, 72 anos, e Eugenio Barrios, 80, em nada lembra a de San Fernando, localizada na província de Buenos Aires. Piso unico, bem mais simples, em um local bem diferente de Nordelta, bairro nobre inspirado em Miami onde hoje moram, na região metropolitana.

Em um campo improvisado ao lado da rodovia Panamericana, Barrios jogava com os amigos. Estava com 13 para 14 anos quando um automóvel de um então estranho estacionou próximo. Após alguns segundos olhando aquele jovem, o “olheiro” perguntou ao pequeno Lucas onde jogava. Diante da resposta negativa, o homem arregalou os olhos e foi conversar com seu Eugenio. A família desde acompanhou o dom que Barrios carregava.

- Hoje temos muito mais do que naquela época, mas éramos felizes, sabe? Nunca vamos esquecer. Nunca vamos vender essa casa. O Lucas já disse: “essa não”. Ela não tem preço. Tem muito sentimento, crescemos aqui - disse Gabriel.

Forno construído pelo pai de Barrios está nas memórias da infância (Foto: Eduardo Moura)

O forno presente em frente à casa, construído das mãos de seu Eugenio, não deixa esquecer os domingos de churrasco. A família é de cinco irmãos e três irmãs. Todos moraram na casa de San Fernando. Gabriel cuida atualmente da reforma da casa de Barrios para deixá-la pronta para as férias. “Tomara que com a taça da Libertadores”, não cansa de repetir.

Na casa atual de Barrios, há espaço reservado para fotos da carreira exitosa. O local conta com um vazio na parede para a foto com a camisa do Grêmio e uma nova conquista. Com arquitetura moderna, o ambiente ainda ostenta uma bela "parrilla". Para manter as tradições dos domingos.

Casa de Barrios tem espaço para premiação da Libertadores (Foto: Eduardo Moura/GloboEsporte.com)

Início da carreira e cria de Gareca

Huracán e Argentino Juniors são os maiores clubes no qual Barrios atuou na Argentina. Ambos no início de carreira. O centroavante foi levado ao Huracán, mas acabou dispensado porque o achavam muito pequeno. Acabou em Bajo Flores, no Argentino Juniors, celeiro de craques como Diego Armando Maradona, nascido em Lanús, veja só, rival de Barrios nesta quarta, Juan Román Riquelme e Juan Sebastián Sorín, entre tantos outros.

Técnico da seleção do Peru e ex-centroavante da Argentina, Ricardo "Flaco" Gareca serviu como um tipo de tutor de Barrios. Foi o treinador a colocar o camisa 18 do Grêmio a jogar no Argentino Juniors na segunda divisão argentina. As principais dicas foram para que deixasse os lados do campo e passasse sempre a usar a zona onde tudo se resolve, a área. O na época apenas argentino passou também pelas mãos de Adrian Domenech, técnico do time B.

- Ele era o goleador do Reserva (como é chamado na Argentina a categoria) onde jogavam jogadores muito importantes. Navarro, Pareja, Caruzzo, Ortigoza, Pisculichi. Não sei porquê (não estourou). Tinha grande condição. Tinha que esperar o seu momento. Era muito jovem ainda. Era um momento ruim do clube - disse Domenech ao GloboEsporte.com.

Em casa, Lucas Barrios é esperança de gol diante do Lanús (Foto: Lucas Uebel / Grêmio, DVG)

A relação com o Argentino Juniors, porém, rendeu muitos frutos a Barrios. Foi ali onde Claudio Borghi, meia formado também no clube, conheceu o centroavante. E o treinador lembrou do atacante quando o Colo-Colo necessitava de um homem de área. A partir de então, Barrios fez sucesso mundo afora, coroado goleador do mundo em 2008 sob o comando de Borghi.

- Sabia o que ele podia render. Talvez no Brasil seja muito comum um jogador com o físico do Lucas, mas no Chile, não. Saímos do mesmo clube, claro que com diferença de idade, perguntei por ele e me deram boas referências. Chegou e rendeu de forma imediata. Se transformou em um grande jogador. Isso me deixa mais que feliz. É um grande garoto e teve como quase todos nós uma infância dura. Às pessoas, só falta às vezes apoio. O resto depende deles - relata Borghi.

Em casa, Barrios tem motivação extra de sobra para a noite desta quarta-feira. Todos podem se tornar heróis na Fortaleza do Lanús. No entanto, quem tem por ofício balançar as redes está, sempre, mais perto. Como está também mais perto de suas raízes. Não há lugar e oportunidade melhores para abraçar sua família e brilhar como nunca.



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