Foto: Lucas Uebel/Divulgação Grêmio
O Grêmio se prepara para fazer um dos jogos mais tensos da história do clube. Com 98,2% de chance de ser rebaixado, o time gaúcho joga hoje (2), diante do São Paulo, sabendo que uma derrota pode significar a queda para Série B com duas rodadas de antecedência, desde que acompanhada de pelo menos um resultado paralelo. Mais do que um jogo físico ou tático, o duelo das 20h (horário de Brasília) será mental. Para jogadores e torcedores.
A partida válida pela 37ª rodada do Campeonato Brasileiro marca a volta dos gremistas à Arena do Grêmio, depois de punição por invasão de gramado. Ou seja, um ingrediente a mais no caldeirão de tensão e ansiedade.
O UOL Esporte ouviu dois psicólogos com atuação no esporte para apontar o impacto do iminente rebaixamento no elenco e em quem apoia o time.
"A questão do rebaixamento é multifatorial. Sempre que se tenta encontrar respostas simples, é impossível. Há uma cadeia de acontecimentos", opinou o doutor em psicologia do esporte, Maurício Pinto Marques.
"Normalmente o fator financeiro pesa bastante, mas o Grêmio pode ser o primeiro, ou um dos primeiros, a ser rebaixado sem salários atrasados, o que torna ainda mais complexo", completou.
Para Marques, o abalo do grupo tem como fator importante as frequentes trocas de jogadores, técnicos e modelo de jogo, algo que abala a confiança do grupo de atletas.
"Há um misto de instabilidade emocional com falta de atitude. Para quem viu o jogo contra o Bahia, isso ficou muito claro. O Bahia, ainda que tecnicamente inferior, fez uma final de Copa do Mundo, o Grêmio, talvez pela pretensa superioridade técnica, de um time que disputou títulos em todos os últimos anos, não. Mas foi um time que mentalmente mudou muito de estilo, de modelo de jogo, de escalação. Ninguém sabe quem é o lateral titular, o atacante, o goleiro. Isso são fatores importantes. Se vê o time sofrendo gols e se desmanchando psicologicamente a ponto da maior liderança técnica, o Geromel, falhar como falhou", opinou.
Na avaliação dele, ações pontuais de motivação ou a opção por desligar sete jogadores durante a semana dificilmente surtirão efeito.
"De forma pontual, um trabalho específico pode dar algum resultado. Mas ninguém joga com a corda esticada o campeonato todo, é muito desgastante. Por isso se nota tanta diferença em jogos de pontos corridos e mata-mata. Não é sustentável a médio prazo", disse.
"A essa altura do campeonato, as mudanças no grupo são ineficazes. O Felipão mesmo disse, quando assumiu o time, que o grupo era muito grande. E é muito difícil trabalhar com um grupo tão grande de jogadores, de ter controle. Quem não está jogando nunca está feliz, e quando há muita troca, cria uma insegurança e até mesmo lideranças positivas viram negativas. Jogadores que estavam fora, entram como solução, depois são afastados de novo. Isso gera um abalo muito grande, e jogador de futebol é movido a confiança", completou.
Além dos problemas internos, gerados por tantas trocas na dinâmica do ambiente, o contexto também agita mais as coisas.
"Quanto mais pressionado o indivíduo fica, menor a condição de flow, de fluxo de rendimento, como a gente diz, de performance. O grau de ansiedade, nervosismo, medo do pior, acaba prejudicando o foco, a manutenção de foco. Quando o medo vem e toma conta, é uma reação antes mesmo de ser racional. O cérebro sente como situação de perigo e o corpo reage. Tudo afeta o próprio desempenho. Libera hormônios diferentes e o corpo, mesmo sem ter consciência, já entra em um estado diferente. E aí o atleta fica sem desempenho, o resultado fica mais longe. Situações mais críticas de estresse prejudicam muito. É uma bola de neve. O futebol tem muito disso, pressão pelo resultado e todo contexto.
Preocupação com a torcida e sem receita antiestresse
Se é duro para quem tem no futebol sua profissão, e fatalmente terá novas oportunidades num futuro breve, quem vê no jogo uma válvula de escape após dois anos de confinamento em razão da pandemia sofre ainda mais. No reencontro com o futebol, o torcedor do Grêmio, acostumado a glórias recentes, pode despencar para uma Série B de forma vertiginosa. E a expectativa costuma caminhar lado a lado com a decepção.
"A gente viu o jogo contra o Palmeiras e a torcida tinha comprado a ideia. Talvez pudesse ter dado algo a mais que o time não conseguiu fazer no campo. Tenho para mim que poderia ter ajudado naquele momento. Mas, na situação atual, em que se levar um gol o rebaixamento é praticamente certo, pode virar a chave. O torcedor vive de emoção, não é racional, ainda mais quando se encontra em grupo. A essência da torcida é a paixão e as expectativas sobre esse grupo, que fez por onde, sempre foram grandes e podem gerar uma grande frustração. Mas times vencedores possuem um ciclo, há uma questão inclusive psicológica nisso", comentou Maurício Pinto Marques.
É muito provável que as arquibancadas da Arena do Grêmio sejam palco de reações extremas. E nem há recurso para evitar as cenas que devem materializar a agonia.
"Sinceramente, não existe uma receita para lidar com isso. Torcedor é fenômeno de massa, não individual. Aí entra cultura de grandes grupos, que tendem a ser mais instintivos. Freud fala isso em análises de massas, que o ser humano baixa alguns degraus em seu nível de civilização quando está em massa", lembrou Maurício Marques.
"Em geral, quando experiências mexem com o emocional, as pessoas tendem a agir de maneira binária: ou amam ou odeiam. Ou a pessoa dá apoio ou xinga, quer destruir. Vai existir, provavelmente, cenário com gente xingando demais e outros quietos", avisou Marcia Pilla.
O conselho possível da psicologia é olhar como se tivesse dado dois passos para trás. Em busca do quadro completo.
"A reação melhor é refletir, pensar, procurar algo para aprender com a situação", frisou Pilla. "Penso que são ciclos, que a banca paga e recebe, e que é preciso saber que isso acontece com todos os times, faz parte do futebol. E que esse é o esporte mais humano e, talvez por isso, o mais popular", completou Marques.
Seja como for, Grêmio e São Paulo será um teste. Para o psicológico dos gremistas.
#gremio #imortal #tricolor #rebaixamento #torcida #brasileirao
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"A questão do rebaixamento é multifatorial. Sempre que se tenta encontrar respostas simples, é impossível. Há uma cadeia de acontecimentos", opinou o doutor em psicologia do esporte, Maurício Pinto Marques.
"Normalmente o fator financeiro pesa bastante, mas o Grêmio pode ser o primeiro, ou um dos primeiros, a ser rebaixado sem salários atrasados, o que torna ainda mais complexo", completou.
Para Marques, o abalo do grupo tem como fator importante as frequentes trocas de jogadores, técnicos e modelo de jogo, algo que abala a confiança do grupo de atletas.
"Há um misto de instabilidade emocional com falta de atitude. Para quem viu o jogo contra o Bahia, isso ficou muito claro. O Bahia, ainda que tecnicamente inferior, fez uma final de Copa do Mundo, o Grêmio, talvez pela pretensa superioridade técnica, de um time que disputou títulos em todos os últimos anos, não. Mas foi um time que mentalmente mudou muito de estilo, de modelo de jogo, de escalação. Ninguém sabe quem é o lateral titular, o atacante, o goleiro. Isso são fatores importantes. Se vê o time sofrendo gols e se desmanchando psicologicamente a ponto da maior liderança técnica, o Geromel, falhar como falhou", opinou.
Na avaliação dele, ações pontuais de motivação ou a opção por desligar sete jogadores durante a semana dificilmente surtirão efeito.
"De forma pontual, um trabalho específico pode dar algum resultado. Mas ninguém joga com a corda esticada o campeonato todo, é muito desgastante. Por isso se nota tanta diferença em jogos de pontos corridos e mata-mata. Não é sustentável a médio prazo", disse.
"A essa altura do campeonato, as mudanças no grupo são ineficazes. O Felipão mesmo disse, quando assumiu o time, que o grupo era muito grande. E é muito difícil trabalhar com um grupo tão grande de jogadores, de ter controle. Quem não está jogando nunca está feliz, e quando há muita troca, cria uma insegurança e até mesmo lideranças positivas viram negativas. Jogadores que estavam fora, entram como solução, depois são afastados de novo. Isso gera um abalo muito grande, e jogador de futebol é movido a confiança", completou.
Além dos problemas internos, gerados por tantas trocas na dinâmica do ambiente, o contexto também agita mais as coisas.
"Quanto mais pressionado o indivíduo fica, menor a condição de flow, de fluxo de rendimento, como a gente diz, de performance. O grau de ansiedade, nervosismo, medo do pior, acaba prejudicando o foco, a manutenção de foco. Quando o medo vem e toma conta, é uma reação antes mesmo de ser racional. O cérebro sente como situação de perigo e o corpo reage. Tudo afeta o próprio desempenho. Libera hormônios diferentes e o corpo, mesmo sem ter consciência, já entra em um estado diferente. E aí o atleta fica sem desempenho, o resultado fica mais longe. Situações mais críticas de estresse prejudicam muito. É uma bola de neve. O futebol tem muito disso, pressão pelo resultado e todo contexto.
Preocupação com a torcida e sem receita antiestresse
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"A gente viu o jogo contra o Palmeiras e a torcida tinha comprado a ideia. Talvez pudesse ter dado algo a mais que o time não conseguiu fazer no campo. Tenho para mim que poderia ter ajudado naquele momento. Mas, na situação atual, em que se levar um gol o rebaixamento é praticamente certo, pode virar a chave. O torcedor vive de emoção, não é racional, ainda mais quando se encontra em grupo. A essência da torcida é a paixão e as expectativas sobre esse grupo, que fez por onde, sempre foram grandes e podem gerar uma grande frustração. Mas times vencedores possuem um ciclo, há uma questão inclusive psicológica nisso", comentou Maurício Pinto Marques.
É muito provável que as arquibancadas da Arena do Grêmio sejam palco de reações extremas. E nem há recurso para evitar as cenas que devem materializar a agonia.
"Sinceramente, não existe uma receita para lidar com isso. Torcedor é fenômeno de massa, não individual. Aí entra cultura de grandes grupos, que tendem a ser mais instintivos. Freud fala isso em análises de massas, que o ser humano baixa alguns degraus em seu nível de civilização quando está em massa", lembrou Maurício Marques.
"Em geral, quando experiências mexem com o emocional, as pessoas tendem a agir de maneira binária: ou amam ou odeiam. Ou a pessoa dá apoio ou xinga, quer destruir. Vai existir, provavelmente, cenário com gente xingando demais e outros quietos", avisou Marcia Pilla.
O conselho possível da psicologia é olhar como se tivesse dado dois passos para trás. Em busca do quadro completo.
"A reação melhor é refletir, pensar, procurar algo para aprender com a situação", frisou Pilla. "Penso que são ciclos, que a banca paga e recebe, e que é preciso saber que isso acontece com todos os times, faz parte do futebol. E que esse é o esporte mais humano e, talvez por isso, o mais popular", completou Marques.
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